terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Que zika é esse vírus

No último fim de semana tivemos o Dia Nacional de Combate ao Aedes aegypti, eu fui a trabalho participar da ação feita no CEU Jambeiro em Guaianazes. Estavam nosso ilustre prefeito Fernando Haddad e o secretário de saúde Alexandre Padilha. O que teve de novo e diferente? Nada. Foi somente uma ação em que os governantes vão em bairros da periferia mostrar que estão empenhados em resolver o problema. A assessoria de imprensa manda releases e os jornalistas vão em peso para tirar foto e fazer entrevistas, mostrando as autoridades como a "mão na massa". Me desculpem ser um pouco crua, mas é somente isso. O governo escolhe um dia para mostrar que se importa e está fazendo alguma coisa. Na prática isso é bobagem. O dia de mobilização contra o Aedes deve ser todo dia. Só que eu me lembre estamos em luta contra o mosquito a pelo menos dez anos. Eu morava em Santos a quase quinze anos atrás e já se falava em epidemia de dengue. Pois é, de lá para cá o discurso pouco mudou. o que mudou mesmo foi o mosquito, ele está ficando "mutante".Antes era só a dengue, agora já temos a Chikungunya e agora a Zika, que só teve destaque por causa dos surtos de microcefalia e a chegada das Olimpíadas no Rio. Só quando as pessoas de fora se preocupam é que resolvemos fazer alguma coisa.
Vamos aos fatos, os sintomas do Zika vírus são mais brandos que o da própria dengue e por enquanto mata menos. Se fosse só isso nem estaríamos dando bola. O vírus provavelmente começou a se desenvolver no Brasil ainda em 2013 e sabem por que?
Na Copa das Confederações recebemos a fraquíssima, porém simpática e carismática seleção do Tahiti (alguém se lembra das memoráveis goleadas sofridas por essa seleção?), que ficou pouco tempo por aqui e esteve baseada em Recife. E o que isso tem a ver com o Zika vírus? Bem alguns anos atrás houve um surto de Zika vírus na Polinésia Francesa, local onde está localizado o Tahiti. Os sintomas da doença são muito leves e pouco se sabe ainda sobre ela. Nós recebemos a delegação do Tahiti, que curiosamente ficou em Recife, local onde teve início o surto de Zika no Brasil e onde começaram as primeiras associações da microcefalia com o vírus. Será coincidência? Não posso afirmar que há relação entre esses fatos, mas é para se pensar. A doença ainda é nova, há pouco estudo a respeito, pode até ser que estejamos enganados e que a microcefalia tenha sido causada por outros motivos, mas até lá é melhor cautela, não acham?
Outro fato que me chama atenção. Me parece que os brasileiros tem pouca informação e em alguns casos pouca preocupação com esse tipo de epidemia. Se houvesse de fato uma luta contra esse mosquito, já não era o caso da situação estar controlada? Porque dez anos depois de eu começar a ouvir e ver campanhas contra o Aedes, ainda estamos lutando e vendo o mosquito vencer. Nosso glorioso Ministro da Saúde e nossa ilustríssima Presidente, não estão totalmente errados. Tenho a nítida sensação que essa guerra já teve inúmeras batalhas perdidas. E o que falta para mudar essa situação? Muita coisa. Para começar é errado o governo jogar toda responsabilidade na população, como se somente a nós coubesse essa luta. Devemos fazer nossa parte, mas é fácil dizer que 85% dos criadouros estão dentro das casas. E a falta de saneamento básico, e o lixo acumulado nas ruas, e a falta de manutenção nos espaços públicos, e o descaso com as periferias que sofrem com inúmeros problemas. Ao questionar o secretário de saúde de São Paulo sobre a relação entre enchente e proliferação do mosquito, eu ouvi que a relação é zero, será? E sabe o que mais, ele me disse que enchente é até bom porque a água que vem lava e remove os focos de proliferação do mosquito. Será que quem mora nas regiões que sofrem com as enchentes concordam com o secretário? E depois para limpar a sujeira, e a quantidade de móveis e outros objetos que se estragam e muitas vezes ficam sem o descarte correto, não acumulam água, não viram lixo pelas ruas e córregos da cidade? Não tenho estudos sobre a relação entre enchente e dengue (ou qualquer outras das doenças), mas a colocação foi extremamente infeliz. Nenhuma das duas coisas deveriam acontecer, nem enchente e nem essa luta sem fim contra o mosquito.
Outo ponto que eu queria destacar é o fato de muitos acharem que os "gringos" estão exagerando. Será que se fossemos um pouquinho mais "exagerados", a situação não estava melhor controlada? Aqui a gente costuma levar tudo numa boa, inclusive os problemas, as doenças, as epidemias, os novos vírus e por aí vai. Eu vivi no Japão e lá ao menor sinal de uma nova doença ou epidemia, já é feito um controle rigoroso tentando evitar a proliferação e disseminação da doença. Sem contar que todo mundo passa a usar máscara (sim, como aquelas cirúrgicas) em lugares públicos.
Rapidamente só para ilustrar o que estou dizendo. Quando regressei ao Brasil, estávamos no auge da gripe suína. Cheguei ao aeroporto e o posto da vigilância sanitária estava fechado, as filas para desembarque estavam enormes, aquela aglomeração de pessoas, nem sequer me questionaram sobre nada (origem, qualquer tipo de sintoma ou algo assim). E tem mais, eu trouxe minha gatinha do Japão, fiz todo o procedimento necessário porque fiquei morrendo de medo que detivessem ela no aeroporto por alguma questão de vigilância sanitária e enfim porque há toda uma burocracia e protocolos a se seguir quando viajamos com animais. Somente no meu voo tinha cerca de quatro animais de estimação. Depois de aguardar quase 1 hora para a liberação dos animais, minha gata e todos os outros animais foram liberados porque não tinha veterinário de plantão, ou seja, não olharam sequer para ver se dentro da gaiola tinha um gato ou um porco. Por isso me choca que nós estejamos tão "take it easy" com essas questões, mesmo sabendo que nosso sistema de saúde é uma caos e é melhor torcer para não ficar doente do que enfrentar uma fila do SUS. Ah e outra, quando cheguei do Japão importei o costume de usar máscara no transporte público durante o inverno a fim de evitar contaminação por gripe, resfriados e outras "cositas mas". Logo abandonei o hábito, me senti um ET andado de metrô com aquela inofensiva máscara. Sem contar que me olhavam com aquele ar de pena, como se eu tivesse uma doença gravíssima ou estivesse a beira da morte. O constrangimento foi tanto que preferi enfrentar as aglomerações e suas possíveis infecções cruzadas. Bom assim vamos criando resistência. Mas é claro não se esqueçam que não é somente nós que ficamos resistentes, os vírus, mosquitos e afins também. Já passou da hora de revertermos essa batalha e acabar com o Aedes. Vamos fazer nossa parte, mas também cobrar para que cada um faça a sua, inclusive governos municipais, estaduais e federal.

http://digital.asahi.com/articles/ASJ2H23SSJ2HUHBI003.html

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